quarta-feira, janeiro 19, 2011

Eternamente Jovem

Eu era uma criança morando em uma pequena cidade do interior. Acostumado a ouvir no velho rádio Roberto Carlos, Wanderlei Cardoso, Jerry Adriani, Diana, Odair José, Secos & Molhados e outros artistas nacionais. Um dia ouvi a abertura de cordas de “Califórnia Dreaming” do The Mamas and The Papas. A harmonia voava nos ares, o doce anseio do poema lírico, o som da costa ocidental levou-me para longe das pequenas brigas com as outras crianças da escola.
Alguns anos depois, por volta dos 17 anos, em um salão de bar, de um velho jukebox uma canção saía e entrava em minhas veias com seus arranjos frescos, e as palavras que me pareciam poéticas, quebrando a solidão. Fui informado que era da banda Alphaville, “Forever Young”:

Vamos dançar com elegância
Vamos dançar por um instante
O paraíso pode esperar
Estamos apenas observando os céus.
Desejando o melhor
Mas esperando o pior
Você vai deixar cair a bomba ou não?

Nos deixe morrer jovens
Ou viver pra sempre...
A vida é uma viagem curta...

Eternamente jovem
Eu quero ser pra sempre jovem
Você realmente quer viver pra sempre?
Pra sempre e todo sempre
Eternamente jovem
Você realmente quer viver pra sempre
Eternamente jovem

Alguns são como a água
Outros como o fogo
Alguns são a melodia
Outros são o ritmo
Cedo ou tarde
Todos terão virado poeira
Porque não permanecem jovens?
É tão difícil ficar velho
Sem um propósito
Eu não quero ser sacrificado
Como um cavalo inútil
A juventude é como um diamante ao sol
E os diamantes são eternos

Tantas aventuras não aconteceram hoje
Tantas canções que esquecemos de tocar
Tantos sonhos aparecendo do nada
Nós os tornaremos realidade

Eternamente jovem
Eu quero ser pra sempre jovem
Você realmente quer viver pra sempre jovem?
Pra sempre e todo sempre
Eternamente jovem

Eu jamais esqueci o impacto desse som deslizando em mim e descobri como a arte pode, inesperadamente, entrar em nossas vidas, deixando uma marca inesquecível.
Tentando construir um acervo de vídeos das músicas que me marcaram, percorri o Youtube selecionando esses momentos mágicos. Ali estava o Alphaville com seu clip original, da década de 80. O vocalista Marian Gold, no frescor de sua juventude, e seus jovens companheiros de palco. Mas ali também estava alguns vídeos recentes, como a apresentação da banda em um festival de 2007. Eles cantavam “Eternamente jovem”, e confesso que as palavras me soavam como um melancólico desejo não atendido. O tempo passou, eles envelheceram. Tudo dentro do roteiro estabelecido. O jovem esbelto tornou-se um senhor rechonchudo. Mas a música permanece embriagantemente moderna.
O Alphaville foi o porta-voz do maior sonho humano: viver pra sempre. De preferência, jovem. As modernas clínicas de cirurgia estética, os spas e as academias de ginástica tentam deter, ou pelo menos, adiar, o inevitável envelhecimento do corpo. A ilusão de uma juventude eterna permeia a existência humana; continuamos a busca sem êxito da “fonte da juventude”.
Exercícios são elaborados, capas de revistas apresentam modelos com rosto sem rugas e corpos atraentes; fitas de vídeo, exercícios e cremes prometem rejuvenescimento, basta seguir a receita prescrita. Academias de ginástica e cirurgias plásticas tentam mascarar o envelhecimento.
“A juventude é como um diamante ao sol... E os diamantes são eternos... Eu quero ser pra sempre jovem”, cantava o cinqüentenário vocalista. Mas o corpo denunciava o desejo não realizado.
Aos cristãos foi prometido a vida eterna e um novo corpo. Seremos “revestidos da nossa habitação celeste” (II Cor. 5:1-8). O elemento mortal será “absorvido pela vida”. Qualquer que seja nossa aparência exterior, nossa intelectualidade e nossa natureza espiritual, no céu será a de um santo que é maduro e que tem as faculdades completas de um adulto, para que possa desfrutar tudo o que Cristo preparou para nós. Nossos velhos pais que, provavelmente, já perderam o vigor físico, estarão de posse de um corpo espiritual rejuvenescido, aptos para desfrutar de tudo aquilo que pode ser experimentado.
Os filósofos medievais acreditavam que teríamos, no céu, a idade de 33 anos, considerada a idade ideal, de maturidade, reflexos da duração da vida terrena de Jesus Cristo. Uma lenda chamada “A corrente purificadora” diz que “Aqueles que viveram até a idade adulta, serão trazidos de volta na idade de quarenta anos; aqueles que morreram crianças serão trazidos com a idade de quinze anos; todos viverão felizes com suas famílias e amigos”.
As imagens, os sons e as palavras são tatuados em nosso interior. Nós temos uma arca de tesouros que nos acompanha na jornada. De vez em quando preciso ouvir uma suave melodia, ver uma determinada cena de um filme, reler um trecho marcante de um livro ou apreciar um quadro que fala comigo.
O poeta Tennyson dizia que nem o mundo natural e nem a religião tinham a palavra final sobre a vida e sobre Deus – devemos escutar ambos a fim de compreender: um poeta viajando pela mudança das estações ou o verso de um hino apontam para o alvo maior.
Não consigo compreender as pessoas que não se encantam com a natureza, os livros, as músicas, os filmes e as pinturas. Encontro beleza e conforto na arte e na natureza, e direção na Bíblia. E assim prossigo a minha dança, exultante, balançando o meu corpo rechonchudo ao som de “Eternamente Jovem”, enquanto meu pé direito diz “Aleluia” e o meu pé esquerdo “Amém”.

(Trecho extraído do livro "Relíquias de Uma Terra Estranha" de Samuel Rezende)

Um comentário:

Marlene Maravilha disse...

Samuel, meu querido amigo e irmao!
Eu ganho sempre muito quando leio alguma coisa que escreves, é uma lástima que leia tao pouco...culpa minha com certeza.
TEm muitas verdades neste post, embora queira dizer muito, vou falar somente o realmente essencial, contigo danco e digo Aleluia-Amém! e seguimos rodopiando enlacados pela fé inabalável!
Feliz Pascoa! e um grande beijo!